quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O rapaz do avião - 27


Levantei-me para ir à casa de banho e quando voltei fiquei presa no corredor, porque as hospedeiras de bordo andavam nas vendas e, com o carrinho, impediam a passagem. Apoiei-me na cadeira que estava à minha esquerda, enquanto esperava para passar e reparei que estava sentado um rapaz novo que, pela conversa, pertencia a um grupo de estudantes em viagem de finalistas aos EAU. Já os tinha ouvido falar uns com os outros, porque se levantavam constantemente e trocavam de lugares entre si e percebi que também iam de férias para o Dubai.

De repente, enquanto aguardava para poder passar, reparo que o rapaz da cadeira onde eu estava apoiada, tinha as mãos sobre as pernas, uma ao lado da outra, com as palmas abertas e viradas para cima. Mesmo sem querer, olhei e, rapidamente, fiz uma leitura das mãos dele, que me deixou completamente em alerta. O rapaz era novo e eu não lhe via a cara, porque estava atrás da cadeira, mas teria a mesma idade dos outros que rondavam, em média, os vinte, vinte e um anos, e as mãos dele tinham um traçado completamente anormal. Era muito mau. 

Então, concentrei-me para ver melhor, mas aquilo era o que se poderia chamar "falta de sorte". Algo muito terrível o perseguia pela vida fora. Algo contra o qual ele não podia fazer nada. Não sei se seria um acidente, uma doença, mas o percurso de vida dele estava completamente distorcido. Àquela distância não era possível entrar em pormenores, mas o traçado mostrava claramente que seria vítima de algo que lhe marcava a vida negativamente e sem volta.

Olhei para os outros e achei-os todos normais, cheios de vida, rapazes e raparigas saudáveis e eu não sabia como encarar aquilo. Só pensava comigo mesma "coitado, coitado!" Porque é que eu tinha que passar ali naquele momento? Podia ter passado e não ter visto e estaria muito mais feliz, então. Mas vi e não podia fazer nada. Ou podia? Seria correcto falar com ele para dizer o quê? Por exemplo: "olhe, tenha atenção a um acidente ou a qualquer coisa que põe a sua a saúde em risco e muda a sua vida para sempre"... iam rir-se de mim(!). Tão certo como certo. O que é que eu podia fazer!? Ainda iria a tempo? Mudaria alguma coisa? Qual seria a reacção dele, depois de saber aquilo? Como é que ficaria se acreditasse que seria vítima de uma fatalidade? Era terrível! E ia de férias todo tranquilo e satisfeito!... E pensar que eu era portadora de um segredo tão horrendo!? Nada daquilo era agradável e eu não queria estar naquele lugar. Como é que eu poderia saber se se confirmariam as minhas suspeitas? Nunca mais o veria. Mas também podia estar enganada e isso seria óptimo. Podia ser, claro.

Entretanto, tentava olhar as mãos dos outros, não sabendo bem porquê, mas talvez para confirmar que estava tudo bem e que com aquele seria uma excepção, o que não aconteceu, porque eles não paravam de falar, gesticular e as mãos não estavam com as palmas visíveis. E foi então que me ocorreu uma coisa. Porque é que eu via as palmas dele sempre viradas para cima? Não era muito confortável aquela posição! Ao mesmo tempo, a hospedeira de bordo passou e eu tive o caminho aberto. Ao passar, olho de frente para o rapaz. Tal foi o meu espanto. Ele era todo estropiado, coitado. Por isso, as palmas das mãos estavam viradas para cima de forma anormal. O que era, já era. Não me tinha enganado nem havia nada que se pudesse fazer. Estava escrito. Todo o sistema nervoso estava afectado só que, por detrás do banco, não se percebia. Lamentavelmente, não me tinha enganado e não precisava nem de um minuto mais para o confirmar. 

O destino tinha sido implacável e estava rigorosamente cumprido, sem se fazer esperar.