sexta-feira, 28 de julho de 2017

Era ele - 63


Era ele. Não era, não podia ser. Mas era como se fosse. Eu não queria acreditar no que os meus olhos viam. A impressão que tive era tão forte que não conseguia admitir que não era ele.

A noite estava quente. Nem uma brisa corria. O mar calmo, tranquilo. A rua começava a encher-se de gente. Gente para lá, gente para cá. Gente de todas as idades e de todas as nacionalidades. Os feirantes já instalados nas suas bancas iluminadas davam à noite um ar animado. Cada um com seu comércio. Desde as tatuagens às exibições artísticas, nada faltava. Para não falar das lojas abertas e cheias de movimento. E eu olhava descontraidamente quem passava, ao mesmo tempo que espraiava a vista no horizonte escondido pelo cair da noite, onde mar e céu se confundiam.

Um grupo de músicos preparavam o seu habitual show, passando fios, cabos eléctricos, etc… e de repente, olhando para eles… era ele! Era ele sem tirar nem pôr. Desviei o olhar porque senti um arrepio pela coluna de cima a baixo. Não, não podia ser. Isso era certo. Estávamos a cerca de duzentos e cinquenta quilómetros de distância um do outro. Recompus-me do choque emocional e olhei de novo. Estava sempre de costas, mas era a mesma figura. Faltava-lhe um nadinha de altura e era ligeiramente mais forte, mas assim, de repente, a sensação é que estava ali, a escassos metros de distância. Como? Porquê? Porque é que me estava a passar aquela cena pela cabeça? Eu sabia que não era. Em momento algum duvidei da minha certeza. Mas o arrepio que senti quando olhei a primeira e a segunda vez, eram sinal de alguma coisa. Alguma coisa estranha.

A noite estava óptima. As pessoas lá em baixo passeavam com prazer e descontraidamente, apreciando a temperatura que se fazia sentir e dando atenção às bancas por onde passavam. As crianças acompanhavam os familiares, uns de mãos dadas, outros soltos, alguns até correndo e gritando. E havia os mais românticos, que desciam até à beira mar para fazer umas selfies captando o mistério da escuridão nocturna, o brilho da lua na água, ou simplesmente para sentir uma vez mais os pés na areia macia e mergulhá-los na espuma prateada.

Mas eu não conseguia ignorar a “visão” que tinha tido e pela terceira vez olhei. A noite estava ainda mais escura. E a imagem dele persistia em aflorar e tornar-se cada vez mais forte. E quanto mais eu negava, mais forte era aquela coisa que me agarrava com uma impetuosidade efervescente. Até chegava a doer. Que quereria aquilo dizer? Se ele pudesse sentir o mesmo que eu estava sentindo(?)… era como se o meu corpo estivesse enrolado no dele, com aquela chama acesa e ao mesmo tempo uma sensação de paz que ele sempre me passava. Uma coisa indescritível! Era como se os dois fôssemos um só… era deveras bonito, lindo de mais. Aquela visão tinha-me feito chegar tão perto daquelas lembranças. Era tão forte! Que quereria aquilo dizer? Não era normal. Algo estava acima do meu entendimento. Seria possível que estivesse a sentir o mesmo que eu, naquele momento? Quem poderia responder? Não era possível que eu estivesse a sentir aquilo sozinha. Era um sentimento forte demais para ser unilateral. Transbordava da minha pessoa. Transbordava sem limites. Nunca me tinha acontecido nada igual. Aquilo realmente era sintomático. Mas como poderia eu saber se ele estava a sentir o mesmo?

E de repente, pela terceira vez, parei o “delírio”. Achei por bem sair da varanda e ir para dentro. No mesmo instante o telemóvel disparou sinal de mensagem. Quando ouvi, pensei: “Só pode ser ele!” Só isso justificava o que eu estava a sentir.

Era ele.