Há muitos anos atrás e por curiosidade, fui a um Centro Espírita acompanhar uma amiga que habitualmente lá ia. Não aconteceu nada, mas fiquei curiosa e logo me veio a tentação de saber o que era realmente o espiritismo, como funcionava, etc, etc, etc...
Não tencionava lá voltar, mas tinha que adquirir conhecimentos sobre o
assunto. Tinha chegado a hora. Que fazer? Lá no centro tinha visto numa vitrina
alguns livros em exposição e reparei que eram todos do mesmo autor "Allan
Kardec". Quis comprar um, mas não tinha orçamento para isso. Depois, os
livros eram vários e eu não tinha realmente possibilidades de os adquirir.
Os dias foram passando sem que eu deixasse de pensar naquilo. Precisava
de ter conhecimentos de raiz sobre o espiritismo. Talvez esse fosse o
caminho para entender muitas das coisas que se passavam comigo.
Um dia, estava na fila do refeitório para o almoço e estava ao pé de mim o
Paulo, que estudava psicologia. De repente, lembrei-me de lhe perguntar se ele
sabia alguma coisa de espiritismo. Ele respondeu que não e nem acreditava
nisso. Era assunto que não lhe dizia nada. Quis saber a razão da minha pergunta
e qual o meu objectivo, ao que respondi com a verdade: que estava interessada
em saber tudo o que fosse possível acerca do assunto.
Com grande espanto meu, respondeu que, se era para mim, talvez pudesse
resolver o problema. Fiquei entusiasmadíssima e perguntei
como(?). Disse-me então, que o seu falecido avô era espírita e tinha todos
os livros de Allan Kardec, que estavam guardados no sótão da casa deles.
Se eu realmente estava interessada ele emprestar-mos-ia, com a condição de os
devolver à procedência logo que não precisasse mais deles. E porque era para
mim, os confiava plenamente, sendo que, apesar de se tratar de um assunto que
não lhe dizia nada, tinha muita estima nos livros por terem pertencido ao avô.
Entendi perfeitamente e garanti-lhe que teria todo o cuidado com os livros,
como se fossem meus, bem como lhos devolveria logo que fosse possível. Dito e
feito. O acordo estava concluído. Uns dias depois o Paulo trazia-me um saco
cheio de livros. Eu nem queria acreditar que tinha toda a colecção de Allan
Kardec à minha disposição, sem ter gasto um tostão. Era um grande presente da
vida.
Os livros eram muito velhos, muito usados, mas estavam intactos. Sentia-me
eufórica e completamente preenchida, pensando nas horas de deliciosa leitura
que eles me iriam proporcionar e o quanto eu iria aprender com toda aquela
informação. Era uma delícia ter finalmente tudo aquilo ao meu alcance.
Comecei a olhar para eles com olhos de ver. Peguei-lhes um por um. Vi
título por título. Mas depois de tudo isto, deparei-me com um outro
problema. E agora, como é que eu me havia de orientar? Por onde começar? Não
podia ler aquilo à toa. As coisas deviam ter uma sequência! E saber qual seria
o primeiro e o segundo e por aí fora? Ainda não tinha pensado nisso. Mas era
uma questão pertinente que se punha. Guardei os livros todos no saco e fui
dormir a pensar em como resolver o assunto. Estava num beco sem saída. Para mim
era muito importante a orientação de alguém. Mas quem? Os livros tinham vindo
parar à minha mão, isso era certo e fora conseguido sem grande esforço. Fazia
sentido que me viesse alguma informação sobre a ordem dos mesmos. Mas como,
como?
No dia seguinte, todo o tempo pensei naquilo. Não me saía da cabeça que, a
oportunidade de adquirir todo aquele conhecimento, estava mais complicada
do que parecia. De regresso a casa, à hora do dia anterior e depois de ter
encerrado toda a rotina diária, volto a pegar nos livros, um pouco desanimada e
muito pensativa. Espalho-os em cima da minha cama e mais uma vez fico a olhar
para eles sem saber o que fazer. Decido então pegar num, à toa. Pego e olho
capa e contracapa. Vejo o título. Decido que vou abrir mas não não sei
exactamente para quê. Contudo, abro. De repente, exactamente no sítio onde
abro, está uma folha de papel amarelada pelo tempo, com qualquer coisa escrita
numa caligrafia bem desenhada e portanto bem legível. O papel é tão velho que
já nem tem cantos. Achei que não seria nada de importante, qualquer
anotação que por acaso ali fora parar. Não importa. Vamos ver o que está
escrito.
"Paulo, se um dia tiveres vontade de ler estes livros, deves lê-los pela ordem a seguir indicada (seguem-se os títulos pela ordem indicada, um por um). O teu avô que sempre te amará”.
Estava resolvida a questão. Eu podia simplesmente ter pegado num outro livro qualquer. Podia tê-los lido todos, por qualquer ordem e ter pegado naquele em qualquer altura. Podia até ter sido o último e quando finalmente encontrasse as indicações de que tanto precisava, já elas não teriam servido para nada. Mas não foi nada disso que aconteceu. A intuição dizia-me que faria sentido uma sequência. Pegar no livro certo e abrir exactamente no sítio onde estava a indicação, era a chave do sucesso do caminho que naquela altura da minha vida tanto fazia sentido.
Feliz coincidência! Quando o avô do Paulo escreveu aquele manuscrito,
conscientemente, ele não sabia, mas já o estava escrevendo para mim.
Efectivamente, era a mim que ele se dirigia. A ele devo todos os meus
conhecimentos sobre o Kardecismo e o quanto esse conhecimento foi
importante, respondendo às minhas perguntas que não tinham resposta.
Por isso, para ele, onde quer que esteja, o meu sincero e eterno agradecimento.
Quando queremos, queremos. E é aí que, passado, presente e futuro se unificam, igualando espaço e tempo, para dar resposta à nossa soberana vontade.