Quando a minha sobrinha Tathiana ficou grávida da primeira criança fiquei muito feliz, como não podia deixar de ser. Eu ia ser tia-avó. E mais feliz fiquei quando me apercebi de que seria para Fevereiro. Com sorte, poderia ser no dia um, dia em que a minha irmã Guida e avó estreante faria cinquenta anos de idade. Uma feliz coincidência, porque não?
Passaram
algumas semanas e veio a notícia de que seria uma menina. A minha sobrinha
querida ia ser mãe de uma menininha. Comecei imediatamente a tentar adivinhar o
que viria por aí e desfilaram na minha imaginação roupinhas de menina,
vestidinhos, laçarotes, etc… e dentro de mim, intuitivamente, achei que poderia
nascer no dia um de Fevereiro. Eu queria muito que ela nascesse no dia dos anos
da avó materna, a minha irmã querida.
Um dia,
depois de ter tido notícias das duas, da minha sobrinha e da minha sobrinha
neta em gestação, fiquei tão contente que me deixei levar pela fantasia e dei
por mim em plena comunicação com aquela coisinha pequena que iria aparecer por
aí e entrar nas nossas vidas. Dei comigo a falar mentalmente com ela,
pedindo-lhe carinhosamente que nascesse para o mundo no dia do aniversário da
avó, o que seria um belo presente e um acontecimento muito agradável, sem
dúvida.
E ao
longo da gestação, conversei com ela longos momentos. Com frequência,
concentrava-me e telepaticamente ficávamos ligadas. Inicialmente, era um
segredo nosso, um assunto só meu e dela, mas a força daquela sintonia dava-me
cada vez mais a certeza de que, mais do que tudo, estava escrito. Ela daria
esse presente de aniversário à sua querida avó. Fui tomando consciência disso,
interiorizando, e o nosso pacto tornava-se cada vez mais forte, mais convisto.
A data
prevista para a menina nascer era onze de Fevereiro, de modo que, para ser no
dia um, era apenas uma diferença de menos dez dias, o que poderia perfeitamente
ser viável. O meu filho nasceu dez dias antes do previsto. E assim eu
continuava a falar com ela, o que me dava um prazer imenso, um bem estar muito
louco.
Sentia
a energia dela, o respirar daquela vida já tão próxima, tão eminente. Era como
se ela estivesse todo o tempo junto de mim. Conectávamo-nos com uma facilidade
extrema. Entrava no silêncio e ela estava lá, inteira, com toda a plenitude do
seu ser. O mundo inteiro deixava de existir, porque aquela energia se
sobrepunha a tudo.
E quebrei
o meu silêncio tendo começado por falar abertamente para toda a família que ela
nasceria no dia um de Fevereiro, sem medo de errar, porque eu sabia que isso
aconteceria. Não era um palpite, era uma certeza. Estava escrito, registado,
selado e lacrado. Não podia ser violado de maneira nenhuma.
O tempo
foi passando, foi-se aproximando da data e eis que chegou o dia crucial. Acordei
de manhã pensando “é hoje”. Durante a manhã falei com a minha irmã, a futura
avó, para lhe dar os parabéns pelos seus cinquenta anos e mais uma vez,
lembrei-lhe que a neta iria nascer naquele dia. Logo que ela tivesse notícias
me dissesse, que eu estava ansiosa. Ela não ligou e fez-me notar, uma vez mais,
que ainda não estava no tempo.
Mas o
dia foi avançando. Passou-se a tarde e eu sempre atenta aos telefonemas e
mails, à espera da notícia. Passou-se a hora de jantar, vi um pouco de
televisão e sempre à espera. Devia estar a rebentar. Chegaram as onze horas da
noite, a hora de me deitar e dormir, mas nada acontecia. Começava a ficar
inquieta. Onze e meia e o sono começava a ser mais forte do que eu.
O dia
estava a terminar. É claro que havia a diferença horária mas, ainda assim, as
hipóteses começavam a diminuir. Eu não podia estar enganada, era praticamente
impossível. Tinha a certeza absoluta de que ela nasceria naquele dia. Deitei-me
para dormir e pela última vez conectei-me, pedindo-lhe com todo o carinho e o
mais profundo amor, que não se esquecesse do nosso pacto. Estava na hora e
seria um presente para a avó.
Seria
também uma grande decepção a minha falha ou eu estaria a perder as faculdades,
o que teria que aceitar, naturalmente(!). Mas não fazia sentido.
Por volta
da uma hora da manhã o telefone tocou. Lembro-me de ter ouvido o toque lá muito
no fundo, porque já estava embalada no sono. Quem é que ia ligar àquela hora
para o telefone fixo? Eu queria dormir. Ouvi o meu filho a chamar-me baixinho: “mãe,
mãe, é do Brasil, a Inajá”. Achei estranho a Inajá ligar-me àquela hora. Nem me
lembrei que era a outra tia avó por parte do pai. Além disso, supunha que a
primeira pessoa a saber fosse a minha irmã, pela própria filha ou pelo genro,
por isso não liguei uma coisa à outra.
Contudo,
com grande excitação, acabava de ser informada de que a minha sobrinha querida
estava a caminho do hospital. O meu coração disparou. Afinal não me teria
enganado! Aconteceu de repente. Estavam a jantar em família e subitamente, as
dores de parto surgiram, as águas rebentaram e todo o processo acelerou.
Olhei
para o relógio e ainda pus em dúvida se não passaria para o dia seguinte, o que
não estava no meu programa, mas um pouco depois recebemos outro telefonema
confirmando o nascimento da menina. Eu sabia. Eu sempre soube.
Agora
era preciso contactar a avó, minha irmã, de alguma maneira, que estava a dormir
com o telemóvel no silêncio. Pedi ao meu filho para tentar chamá-lo pelo skype
porque sabia que ela o tinha sempre ligado. Com muito custo, conseguimos, mas
ela não acreditava, achava que era brincadeira. Brincadeira de mau gosto, por
ser àquela hora e porque queria ter recebido a notícia pelo genro, em primeira
mão, o que não aconteceu.
Mas estava
a terminar o dia e o nosso pacto tinha que se cumprir e assim, cerca das 22,00
horas, hora de S. Paulo, a nossa pequena dava o pontapé de saída, mudando o
rumo dos planos das festas para aquele dia. A minha sobrinha neta nascia no dia
1 de Fevereiro de 2006, impreterivelmente. O nosso pacto secreto, que há muito
deixara de ser secreto, porque eu sempre disse que ia nascer naquele dia,
cumpria-se extrictamente e rigorosamente e a Tamy nascia, para grande alegria
de todos nós.
Estava
escrito.
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