quarta-feira, 2 de julho de 2014

O número de telefone - 49


O Mica era e continua a ser um dos melhores amigos do meu filho. Conhecem-se desde os oito anos de idade e foram colegas de escola. Para além disso, partilharam muito os tempos livres. Ele morava na torre em frente à nossa, na praceta de baixo, e por isso passavam muito tempo juntos, quer fosse em casa ou fora de casa.

Um dia, estando eu a trabalhar, precisei de contactar o meu filho. Nessa altura ainda não havia telemóveis, pelo que só podíamos contar com os telefones fixos. Liguei para casa, mas ele não atendeu. Parti do princípio que não estaria, a menos que o telefone estivesse com alguma avaria, o que não seria de esperar.

Então, só me restavam duas hipóteses: ou ele estaria na rua a jogar à bola ou em casa de algum amigo. Que fazer? Eu precisava mesmo de falar com ele e, quando isto acontecia, era habitual ligar para casa do Mica porque, se ele não estivesse, estaria com ele em casa de outros, na mesma torre e a mãe, a Ana, mais tarde a minha melhor amiga, saberia dizer-me o paradeiro deles, de modo a tranquilizar-me, da mesma maneira que ela, não raras vezes, ligava para minha casa à procura do filho dela.

Mas então surgiu um porém. É que, por qualquer razão, eu não estava de posse do número de telefone da Ana. Em casa, tinha uma agenda de números de telefone, onde tinha o número, mas não podia ir a casa buscar a agenda, como era óbvio. Comecei a ficar nervosa. Tentei equacionar o número, isto é, fiz um esforço mental para conseguir lembrar-me, mas não conseguia. Não conseguia de maneira nenhuma. E precisava mesmo de entrar em contacto com ele. A hipótese de não falar com ele naquele momento, não podia ser descartada de modo nenhum.  Era imperativo. Que fazer?

Foi então que pensei numa maluquice muito doida, mas que resultou. E eu sempre digo que a nossa mente ou o nosso cérebro, sei lá, tem faculdades múltiplas por explorar e capacidades que nem nos passam pela cabeça. Mas é uma questão de nos pormos à prova. Querer é poder. Essa é que é a chave para tudo.

E de repente, tive uma estranha sensação de "teletransporte". O cenário à minha volta mudou e parecia que tinha caído em casa, de pára-quedas. Vi-me a pegar na agenda para em seguida a abrir. Depois, percorri as letras até ao M de Mica, abrindo a página, onde o meu dedo indicador sublinhou o número. Comecei a ver e a ler os algarismos, com uma tal clareza, que parecia que uma lupa de grandes proporções envolvia a página, focando aquele número com uma luz especial. Conseguia ler na perfeição, cada dígito, com uma definição total. Havia uma rasura, por o número ter sofrido uma alteração, pois até isso estava em foco. A visão era tão nítida, que vi o número que estava apagado e o que depois foi emendado. E mais uma vez estava perante uma situação nova. Não queria acreditar que aquilo era possível. E, novamente, tudo voltou ao normal, isto é, voltei a ver-me no mesmo lugar onde estava anteriormente, no trabalho.

A minha tensão era enorme, porque eu sabia o que estava a fazer e tinha a certeza de que aquilo não era nenhuma fantasia, mas ao mesmo tempo não compreendia como era possível uma coisa daquelas. O facto é que disquei o número e falei com a Ana, que logo chamou o Henrique e eu falei com ele.

Acredite quem quiser.


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