Eu vinha de casa do meu pai, em Queluz, e ia apanhar o comboio para o
Rossio. Optei pelo caminho mais curto, que era seguir sempre junto à linha do
comboio. Cheguei, atravessei a Estação e dirigi-me para o exterior, porque o
comboio partia da plataforma contrária. Não me apetecia nada atravessar a pé as
linhas do caminho de ferro, mas era preciso, pois não havia alternativa.
Aproximei-me da berma e, antes de começar a descer os degraus de acesso às
linhas, tive uma visão. Um comboio apitava para sinalizar a aproximação de
entrada na gare. Via-se o comboio ao fundo e ouvia-se o apito. Eu, que já
estava no meio da linha, tropecei, caí e com o comboio a aproximar-se não me
conseguia mover. Fiquei paralisada sem me poder levantar. O comboio continuava
a apitar, a apitar e a aproximar-se cada vez mais. As pessoas gritavam
"cuidado, cuidado, acudam", mas ninguém fazia nada. E o comboio
apitava cada vez mais, cada vez mais próximo e eu sem me conseguir libertar,
pensava "vou morrer, vou morrer!"...
Nisto, como que acordei do "delírio" em que estava e voltei à realidade.
Respirei fundo e preparava-me para descer os degraus, quando comecei a ouvir os
gritos das pessoas e o comboio a aproximar-se e a apitar insistentemente.
Parei, olhei na direcção em que todos os olhares apontavam e, exactamente, na mesma situação em que eu me tinha “visto” ou imaginado, estava
um senhor já de uma certa idade, caído na linha, aflito, sem se poder levantar, com o comboio a aproximar-se.
A cena que eu tinha visto acontecer comigo, estava a acontecer, só que eu
não estava lá. Outra pessoa qualquer tomava o meu desafortunado lugar. Depois,
o comboio foi afrouxando, afrouxando e o maquinista conseguiu parar mesmo ao pé
do homem, que estava apavorado. Algumas pessoas finalmente chegaram junto dele
ajudando-o a levantar-se, limpando-lhe o fato e compondo-o.
O homem estava transido de medo e eu aterrada, sem conseguir
entender, se é que havia como entender!?
Sem comentários:
Enviar um comentário