terça-feira, 20 de abril de 2010

As férias na Grécia - 21


O Riaz foi trabalhar para a Grécia. Estávamos constantemente em contacto por telemóvel, mas sentíamos muito a falta um do outro, tanto mais que não havia previsão de data de regresso.


Um dia falou-me na hipótese de eu ir para lá, o que era totalmente inviável. Então, pôs-se a hipótese de ir de férias, o que muito me agradou, pois nunca tinha estado na Grécia e aí estava uma excelente oportunidade de conhecer um pouco a Grécia e ao mesmo tempo estar com ele.


Marcaram-se as passagens para Julho e comecei a planear tudo. Sonhava acordada e imaginava mil e uma coisas. Fazia-lhe imensas perguntas por telemóvel, a que ele respondia que logo via quando chegasse.


Um Sábado à tarde, como estava sonolenta, resolvi fazer uma sesta. Recostei-me e adormeci. Mas antes de adormecer, pensei que queria sonhar com a Grécia. Queria mesmo, portanto, programei-me para isso. Daí, a conseguir, era um passo gigantesco. O facto é que adormeci profundamente, tanto que, acordei bruscamente, com o Henrique a chamar por mim. Lembro-me de ter tido noção de acordar de um sono muito profundo, que me estava a saber muito bem. Por sinal, até fiquei um pouco irritada, mas resolvi o problema dele, levantei-me para ir buscar um copo de água, olhei para o relógio, porque queria continuar a dormir e de repente lembrei-me que estava a meio de um belo sonho. Sonho esse que estava numa parte muito bonita, quando foi abruptamente interrompido. Então concluí que não devia ter acordado, porque queria continuar a dormir e a sonhar, mas a sonhar aquele mesmo sonho. Voltei rapidamente para o meu aconchego, fechei os olhos com muita força e disse para mim mesma que tinha que entrar no sonho, no sítio onde estava. Também estava claro no meu consciente que isso era uma utopia, mas de um jeito quase infantil, decidi descartar essa hipótese e acreditar que seria possível. Quanta loucura!

 

O facto é que voltei a dormir e quando acordei, percebi que tinha entrado novamente no sonho, no mesmo sonho que, por sinal, tinha tido continuação. Lembro-me de acordar e ficar tão espantada com tal situação, que pensei comigo mesma "e não é que entrei no mesmo sonho, sem que tivesse havido interrupção!". Achei aquilo absolutamente fantástico. Nunca me tinha acontecido e nunca pensei que fosse possível.

 

Mas o reino do fantástico não fica por aqui. Quando acordei, de ambas as vezes, foi como se tivesse acabado de chegar daquele lugar do sonho. Era uma sensação de que tinha acabado de chegar a casa, ao meu corpo, porque era tudo muito real. De facto, eu tinha estado lá e como, mas isso só mais tarde saberia. Para todos os efeitos, naquele momento, tinha regressado de algures que eu não sabia onde era, mas que tinha sido perfeitamente real. E até aí só achava curioso o facto de ter conseguido voltar ao mesmo sonho, à mesma cena, depois de já ter acordado.

 

Revi o sonho várias vezes, como um filme. Havia uma casa, mais casas e paisagens. Mar. Mar lindo. Muitas paisagens lindas. No meio desse filme apareciam uma série de flashes instantâneos, como se uma janela se abrisse. Mas eram de uma beleza tão grande que me ficaram bem marcados. E passavam pela minha lembrança, que as retinha, em prol da beleza, pensando onde é que eu teria ido buscar tudo aquilo, ou melhor, onde é que eu tinha estado? Essa era a pergunta certa.

 

Enfim, nunca suspeitei de nada. Achei que era uma coisa fantástica ter tido um sonho maravilhoso, com tanta coisa deslumbrante, mas era só isso. Onde o sonho me tinha levado eu não fazia a menor ideia. Mas havia como que uma certeza de que aqueles lugares existiam, apenas e somente pela clareza com que os tinha visto, pela força da sensação de presença física que me tinha marcado ao acordar e mais nada.

 

Foi como se eu tivesse ido ao cinema e tivesse assistido a um filme com um intervalo.

 

As coisas que a nossa mente prodigiosa consegue!


O tempo foi passando e julho chegou, trazendo a minha tão esperada viagem. O Riaz estaria à minha espera no aeroporto de Atenas, conforme planeado e depois apanharíamos um "overcraft" ou outro daqueles barcos maravilhosos que vão para as ilhas.

 

Sete horas da tarde, 36 graus centígrados, o Riaz chama um táxi. Estamos em Hermíoni, a caminho de casa. Cansada, mais propriamente por conta do calor e da emoção, do que de outra coisa qualquer. Depois de matar as primeiras saudades, fico a ver a paisagem. Acomodo-me e tento relaxar, enquanto o táxi percorre aquelas estreitas estradas da ilha, com características muito portuguesas. Está quase, quase, a cair a noite. Mais meia hora e estará escuro. O táxi vai fazendo o percurso numa estrada cheia de curvas que me mostra o mar, tão bonito e o horizonte cheio de cor, bem como o pôr-do-sol. E de repente, entre uma curva e outra, abre-se uma clareira, na qual se insere um quadro da natureza, de uma beleza indescritível. Foi como um flash. Olhei para trás para agarrar aquela vista, mas já tinha passado. Só que, apesar disso, eu já tinha visto aquele mesmo cenário, aquele mesmo flash. Eu vi. Enquanto isso, já noutra curva, eis que aparece outro cenário maravilhoso, noutra perspetiva da ilha, tão bonita quanto a outra e eu sei que já vi antes. E repetem-se. Parecem slides a passar à minha frente. É lindo. E outro e outro.

 

Pois vi, eu sei que vi... no sonho. O sonho que tive um dia durante a sesta, em que me programei para sonhar com a Grécia. Quando acordei, percebi que tinha estado em espírito, num lugar muito belo, mas não sabia onde era. Aí estava ele. Afinal a minha programação não falhara. Se acreditássemos a cem por cento em nós, a nossa área de conhecimento seria bem diferente. Bom, mas isso é utopia. Se assim fosse não seríamos homens, mas sim deuses e por enquanto não somos deuses, somos apenas um "projecto" - o homem - o sonho dos Deuses.

 

O inconsciente é um poço de surpresas.

 

Oito e meia da noite, o táxi pára. Chegámos àquela que seria a nossa casa durante as minhas férias. Estava escuro, não se via grande coisa e eu estava cansada e agitada, com tanta novidade. O local não era especialmente iluminado. Passei o jardim e entrei em casa. Vieram os irmãos do Riaz dar-se a conhecer e fazer a sua saudação muçulmana, para logo depois se retirarem. Entrei, arrumei a bagagem. Vi a casa, orientei-me. Da janela ouvia o mar, o mar que sempre ouvia quando falava com o Riaz ao Telemóvel e com que eu tanto sonhava. Descansámos, falámos e dormimos. No dia seguinte continuei a acomodar-me e não pararam as apresentações. Não era a portuguesa, mas sim a portugália, mulher do Riaz, que toda a gente queria conhecer e eu ainda me sentia cansada, mas então veio o dia seguinte, o segundo dia.

 

Manhã cheia de sol - "Kalimera" - o Riaz dá-me os bons dias e quer que me levante para ver a ilha. Levanto-me, enfio o meu vestido comprido azul, de algodão indiano, leve e solto, meio transparente e abro as janelas de madeira pintadas de azul, tão características das ilhas gregas.

 

Huau! Já me tinha esquecido. Tenho um jardim lindíssimo, só para mim, cheio de árvores carregadas de flores e roseiras lindas, divinamente perfumadas. Isto tudo só para mim. E o mar! A praia mesmo ao fundo do meu jardim. A minha praia privativa. Saio de casa, os irmãos do Riaz já saíram para ir trabalhar, excepto o Taj, o mais novo, saúda-me - "Salamalecum" madame - retirando-se rapidamente para dentro de casa. Enquanto eu estiver ali, ele não poderá permanecer cá fora. Regras de outras culturas. 


Encaminho-me para a praia, a minha praia. Caminho um pouco sobre as pedras cuidadosamente polidas por quantos pés já ali passaram, por quantas ondas já ali bateram. São suaves, óptimas para massajar a planta do pé e a água chega até mim, devagar, de mansinho, quente... tudo isto é um sonho. Tudo na medida certa, tudo de bom tamanho, mas muito mais do que pedi a Deus. Até custava a acreditar, tudo aquilo só para mim. Tiro rapidamente o vestido e mergulho na água, sem o menor esforço. A água é quente, quente como eu gosto. O Riaz fica a ver e a tomar conta de mim, pois a mulher de um muçulmano não pode ser observada por nenhum outro homem. É uma falta grave que dá direito a morte. Só que eu estou ali para fazer tudo, tudo o que me apetece, tudo a que tenho direito. São as minhas sonhadas férias na Grécia. E todas as regras vão ser quebradas ou pelo menos, quase todas.

 

Saio da água, enfio o meu vestido azul de algodão indiano, porque não posso ficar exposta, sem roupa. A mulher de um muçulmano, nunca. Mas só estamos no primeiro dia. Devagar, devagarinho, com o passar do tempo, as coisas vão ao sítio e eu conheço o meu homem.

 

O Riaz ficou sentado a fumar e eu aproveitei para caminhar um pouco. Caminhei até ao hotel mais próximo, sempre pela beira da água. Todos sabiam já quem eu era, a mulher europeia do Riaz.

 

Continuei a caminhar, sozinha. Já não se avistava ninguém. Parei, olhei para trás e aí estava ele, o meu sonho. A casa, as outras casas, os jardins, a praia, agora sim, estava certa. Não era a primeira vez que via tudo aquilo e não era a primeira vez que estava ali. Naquela tarde em que dormi e sonhei, não foi só um sonho. Eu tinha estado ali em espírito, por isso a minha sensação de presença física era tão forte. Eu já conhecia aquele lugar. Ah, mas isso era apenas a primeira metade do meu sonho, porque chegava ali e parecia que tudo acabava. Provavelmente, a segunda metade era fantasia do meu subconsciente, de tanto querer continuar o mesmo sonho. Mas isso era o que eu pensava.

 

Passaram-se uns dias e contei ao Riaz o meu sonho. Ele achou graça e disse-me que havíamos de encontrar a segunda parte. Rimos juntos e as coisas ficaram por aí, até que um dia, os dois juntos, caminhámos até àquele mesmo sítio onde parecia que tudo terminava. Mas o Riaz fez-me sinal para o seguir, dizendo que do outro lado era muito bonito. Eu duvidei, dizendo-lhe que não podia ser, que ali já não havia por onde ir. Como ele continuou a caminhar, limitei-me a segui-lo, sem me importar para onde ia e fui atrás dele, sempre com a cara no chão, para ver bem onde punha os pés. 


Passámos umas pedras grandes e o sol apareceu de frente. Parei para proteger a cara da luz, fui-me virando e realmente o Riaz estava certo. Eu nem queria acreditar no que via. Era um sossego e uma paz do outro mundo. Praia a perder de vista, tão calminha que parecia um lago. Casas super luxuosas, como eu sempre sonhei, todas envidraçadas, as pessoas estavam lá dentro como se estivessem ao ar livre. Eram alemães, na sua maioria, explicou-me ele. Não havia uma casa em cima da outra. Cada uma era uma ilha isolada, sem interferência das outras, no entanto, ninguém precisava de se esconder, as pessoas respeitavam o espaço dos outros e a vida de cada um. 


Aquilo era outro mundo, o mundo dos milionários, talvez, mas era bonito. A mim bastava-ma a casa de quatro divisões, onde estava instalada, com um jardim à volta e a praia em frente. Sem dúvida, era o meu paraíso, mas aquele lado da ilha, de outro ponto de vista, era soberbo. Além disso, era a segunda metade do meu sonho e isso era, sem dúvida, relevante para mim. Agora estava tudo encaixado, tudo explicado e eu sabia que aquela viagem tinha sido um presente dos deuses.

 

Sem falsa modéstia, na Grécia fui tratada como uma rainha. Comi deliciosos manjares feitos especialmente para mim. Ofereceram-me as melhores frutas que já comi. Na Grécia, as crianças dançaram para mim. As pessoas vinham-me cumprimentar e elogiavam-me de todas as maneiras e feitios, bem como os meus vestidos e os meus chapéus e de tudo fizeram para que eu me sentisse em casa. Uma verdadeira conspiração holística.

 

Aquele sonho estava impresso num pergaminho bem real - a vida.

 

Escrevi às minhas colegas dizendo "Se os deuses um dia passaram pela terra, é certo que reservaram este lugar para seu deleite e prazer".

 

2 comentários:

  1. A história na Grécia é fascinante. Deve ter sido uma experiência magnífica. Quando voltar da India quero um blog sobre a viagem, com pormenores!!

    Beijinhos e um bom dia!

    Tânia

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  2. Obrigada, filhota do coração. Um bj grande.

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